quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Cartas do bem

De Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal sobre o “achamento” do Brasil; de Getúlio Vargas ao povo brasileiro pouco antes de seu “suicídio”; de Julieta para Romeu – que, extraviada, acaba provocando a morte dos dois; dos analfabetos da Central do Brasil – pelas mãos de Dora (Fernanda Montenegro) – a seus parentes que ficaram para trás; de soldados no front a suas mães e esposas saudosas; de amor; de rompimento; de reconciliação; de recomendação; entre escritores; oficiais; anônimas.

Com a nova era digital, as cartas parecem ter se tornado obsoletas. Mas nem sempre. Tentando resgatar a importância da escrita na vida de crianças e adolescentes carentes que moram em abrigos* ou freqüentam núcleos sócio-educativos*, a diretora de teatro Muriel Matalon criou, há quatro anos, o projeto Correspondentes do Bem.

A idéia é que através de cartas trocadas com voluntários adultos (acima de 25 anos), elas desenvolvam sua capacidade de ler, escrever, interpretar o que está sendo dito e elaborar melhor seus pensamentos e sentimentos.

Atualmente, cerca de 780 adultos e o mesmo número de crianças de 28 abrigos e 3 núcleos sócio-educativos participam do projeto. Depois de passar por uma avaliação prévia feita pelas psicólogas do InPrós – Instituto de Projetos Sociais, o voluntário aguarda a primeira cartinha da criança e tem até 20 dias para responder.

Nesse processo, eles se ajudam e aprendem muito uns com os outros, expondo e explicando seus sentimentos e situações de vida. Para preservar os participantes, não é permitido que se encontrem ou tenham outro tipo de contato além das cartas – que são sempre intermediadas pelo instituto, onde as psicólogas responsáveis fazem uma leitura sigilosa das correspondências e só depois as encaminham para os destinatários.

Desde o início do projeto, mais de 11 mil cartas já foram trocadas. Se você também deseja ser um correspondente do bem, precisa ler o Manual do voluntário e preencher um questionário de identificação e termo de compromisso e enviá-los à Central de Atendimento do projeto (veja instruções completas para participar no site do projeto). No momento, há 159 voluntários esperando a primeira carta de seus pequenos correspondentes.


* Os abrigos acolhem crianças que são retiradas dos pais por diversos motivos – como negligência, maus tratos, abuso sexual, abandono ou dificuldades sócio-econômicas – onde elas ficam morando até serem adotadas ou retornarem para suas famílias, de acordo com decisão do juiz das Varas de Infância e Juventude.

** Já os núcleos sócio-educativos são espaços freqüentados por crianças e adolescentes, de 6 a 14 anos, no período em que não estão na escola, na tentativa de que não fiquem na rua o restante do dia. Lá, elas fazem os deveres do colégio, participam de aulas de esporte, de música e de cursos profissionalizantes e recebem orientações de saúde e alimentação.

Leia também:
Correspondentes do bem: lições de amor em cartas

Nenhum comentário: